Alita Falcão e Vívian Oliveira – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – A recente aprovação na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei 2720/2023, que visa proteger figuras políticas, seus aliados e familiares de discriminação, na verdade, tem sido apontado por especialistas como uma medida para ‘blindar’ essas pessoas da operação Lava Jato.
Isso porque a proposta – que ainda passará pelo crivo do Senado – estipula pena para quem “negar, na condição de representante de instituição financeira, a celebração ou a manutenção de contrato de abertura de conta corrente, concessão de crédito ou de outro serviço”, mesmo que essa pessoa esteja respondendo a processo de corrupção ou qualquer outra investigação de infração penal, civil ou administrativa.
“Foi mais uma inovação da legislação brasileira, aprovada em regime de urgência, sem passar pelas comissões, para proteção aos políticos e pessoas mais próximas. Vimos a criação de uma verdadeira casta à parte, promovendo desigualdade acintosa. Está claro o abismo entre a vontade do povo e a intenção dos parlamentares de legislar em causa própria”
Anderson Fonseca, professor de Direito Constitucional e advogado
O texto, aprovado por 252 votos favoráveis, é de autoria da deputada federal Dani Cunha (União Brasil – RJ), filha do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e um dos principais alvos da Operação Lava Jato.
Caso passe no Senado, o ‘escudo jurídico‘ a pessoas politicamente expostas será mantido por cinco anos após o mandato ou a saída de cargo público. A pena a quem descumprir a medida é de reclusão de dois a quatro anos e multa.
Para Liege Albuquerque, mestre em ciência política pela USP (Universidade de São Paulo) e especialista em direitos humanos, o projeto pode sim corrigir algumas injustiças. “Se o Projeto de Lei ajudar familiares, que não estejam envolvidos em crimes, a não serem discriminados na hora de concessão de crédito, ou conseguir um emprego, trata-se de uma medida justa”, disse. “Sempre achei injusto que parentes de qualquer criminoso, seja ele político ou não, venha a sofrer qualquer tipo de sanção por causa de seus familiares“, completou.
Como votou a bancada amazonense
Dos oito deputados do Amazonas, apenas três foram contrários: Amom Mandel (Cidadania), Sidney Leite (PSD) e Alberto Neto (PL). Foram favoráveis os deputados Saullo Vianna (UB), Fausto Jr. (União Brasil), Silas Câmara (Republicanos), Átila Lins (PSD) e Adail Filho (Republicanos).
“É um absurdo! Não teria como votar de outra forma. Propor um projeto para tornar crime a discriminação contra políticos é legislar em causa própria, não faz sentido criar essa blindagem”, disse o deputado federal, Amom Mandel.
Em Manaus, o vereador Rodrigo Guedes (Republicanos) também expressou sua indignação com o resultado da votação. O político classificou o desfecho como uma tentativa de silenciar aqueles que apontam as falhas de figuras políticas.
“Se você não quer ser incomodado, não quer ser criticado, é melhor você ficar fora da vida pública. Não precisa de lei pra isso. O ordenamento jurídico já dá a qualquer pessoa o direito a sua honra, à imagem e se a pessoa for ofendida de forma injusta, ela pode entrar com um processo judicial, pode requerer seus direitos na justiça”, apontou o vereador.
Transparência
O ex-deputado federal e atual coordenador-geral do escritório estadual do Desenvolvimento Agrário do Amazonas, José Ricardo (PT), avaliou o PL como desnecessário, reforçando o argumento de que políticos já estão sujeitos a maior exposição, cobranças e críticas, e que existem mecanismos legais e constitucionais para a defesa de qualquer cidadão, inclusive os políticos.
“Nós temos é que avançar no processo de transparência, começando pelo processo eleitoral. Porque tem político que ganha eleição com a força do dinheiro, com a compra de voto, com o uso da máquina. Isso sim tem que ser denunciado e, depois no exercício dos mandatos, a cobrança e a prestação de contas”
José Ricardo, ex-deputado federal
Ele defende a necessidade de fortalecer políticas públicas em áreas como saúde, educação e na erradicação da pobreza. “O foco deve estar na construção de uma sociedade cada vez melhor, baseada em políticas públicas eficientes e na preocupação com as necessidades da população. É dessa forma que a gente vai construir uma sociedade cada vez melhor”, concluiu Zé Ricardo.