Vívian Oliveira – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Após declaração do presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, reconhecendo a responsabilidade de Portugal no extermínio de indígenas durante o período colonial, ativistas e especialistas discutem sobre os próximos passos. Rebelo de Sousa afirmou que Portugal deve assumir os custos dos massacres e devolver bens saqueados, mas não especificou como será feito.
Em resposta ao Portal RIOS DE NOTÍCIAS, a artista visual e bióloga Uýra, que recentemente apresentou o especial “Falas da Terra”, da TV Globo, enfatizou que a responsabilidade europeia pelas atrocidades coloniais precisa ser seguida por ações concretas de reparação.
“A culpa e responsabilidade pelas brutalidades das invasões coloniais, incluindo genocídios e roubos de patrimônio cultural e biológico, vem muito lentamente sendo assumida por países europeus, mas sem que estes, efetivamente, explicitem quando e como irão fazer reparação aos territórios e povos violados. Não basta dizer que erraram, nessa frequente ‘mea culpa’. É preciso que tenham ações concretas em frente ao irreparável”, enfatizou a artista visual.
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“Cito ‘irreparável’ pois a colonização deixou marcas materiais e imateriais irretiráveis: na racialidade, na cultura, na terra, no espiritual e no psicológico dos povos violados”, complementou.
Uýra defende que as nações colonizadoras devolvam os patrimônios roubados e invistam em projetos educacionais, culturais e de combate à desigualdade nos países colonizados.
“Que, minimamente, essas nações que se assumem responsáveis devolvam os patrimônios roubados com investimentos e colaborações para garantir estrutura museal e de salvaguarda às nações de origem; que invistam maciçamente em projetos de educação, de cultura, cidadania, de combate à fome e desigualdade nos países colonizados”, disse Uýra.
“Não há reparação sem que abram os bolsos, sem que devolvam o ouro roubado. O antirracismo e anticolonialismo têm que ser práticos. Se não, não são”, afirmou.
Ações concretas
O jornalista e ativista indígena, Pedro Tukano, endossa os argumentos de Uýra, destacando a importância do reconhecimento por parte de Portugal, mas ressalta a necessidade de medidas práticas em vez de meras palavras.
“Como o próprio presidente disse ‘reconhecer a culpa é a parte fácil’, mas reconhecer a responsabilidade do crime etnocida já é um caminho para entender a realidade deixada pela herança colonial que construiu e constrói um Brasil com sangue indígena. Queremos ações concretas, como movimento indígena de pindorama, que neste mês encontra-se em Brasília reivindicando o direito ao território e de tantos outros direitos que nos pertence de forma originária, um direito que antecede a própria constituição, mas que são constantemente violados”, pontuou Tukano.
Pedro pede o apoio de Portugal e de outras instâncias internacionais para combater as violações aos direitos indígenas no Brasil.
“Essa guerra silenciosa já levou diversas lideranças indígenas, como Nega Pataxó e outros parentes que se foram protegendo e lutando por seus territórios. Mortes essas, fruto da herança colonial capitalista, comandadas e praticadas por homens que são filhos de um pai europeu que deixou como legado o pensamento de que são os donos de tudo e que tudo podem fazer, tratando-nos como invasores. Mas os invasores são eles”, denunciou o indígena.
Diálogo entre Portugal e Indígenas
Tukano destaca a urgência de diálogo direto entre o presidente português e as lideranças indígenas brasileiras para entender a realidade dos povos afetados e iniciar o processo de reparação junto ao estado brasileiro.
“Se eu pudesse dar um recado ao presidente de Portugal, diria para vir ao Brasil dialogar, cara a cara, com as lideranças dos mais 300 povos indígenas que resistiram e por aqui vivem, para entender a realidade de cada povo e as consequências deixadas pela invasão portuguesa, para assim começarmos os reparos junto ao estado brasileiro que também caminha a passos lentos ou finge caminhar no reparo dos nossos direitos”, concluiu.