Patrick Motta Jr – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Desde sua chegada ao Brasil, em novembro de 2024, o projeto World, desenvolvido pela Tools for Humanity e cofundado por Sam Altman (criador da OpenAI), tem ganhado atenção nas redes sociais por oferecer recompensas financeiras a quem aceitar escanear sua íris.
A proposta, que visa revolucionar a validação de identidade digital, também tem levantado preocupações quanto à privacidade e segurança dos dados sensíveis envolvidos no processo.
O objetivo do projeto é criar uma “prova de humanidade”, diferenciando pessoas de robôs e inteligências artificiais na era digital. A tecnologia utiliza o World ID, um passaporte digital baseado na biometria da íris que permite comprovar a identidade de forma anônima. Apesar da inovação, especialistas alertam para os potenciais riscos de segurança e os perigos associados à entrega desse tipo de dado sensível.
Como funciona o projeto World?
O processo de participação ocorre em duas etapas: download do World App, onde o usuário configura uma carteira digital e cria sua conta e o escaneamento da íris com o dispositivo Orb, que é um aparelho esférico desenvolvido pela Tools for Humanity que escaneia a íris e gera um código criptografado, supostamente sem armazenar imagens do usuário.
Atualmente, os pontos de coleta estão concentrados apenas em São Paulo (SP). Em troca, os participantes recebem tokens WLD, cujo valor aproximado por pessoa tem sido de R$ 740. Desde o lançamento, mais de 115 mil brasileiros concluíram a verificação em menos de um mês, enquanto cerca de 540 mil já baixaram o aplicativo no país, segundo dados da empresa.

Embora a tecnologia seja inovadora, especialistas em direito digital e inteligência artificial destacam os riscos associados ao projeto. Em entrevista ao Portal RIOS DE NOTÍCIAS, o advogado em direito digital Aldo Evangelista e a pesquisadora Laize Minelli alertaram para os perigos de compartilhar a biometria da íris, um dado altamente sensível, especialmente em troca de um benefício financeiro imediato.
“Risco incalculável para os dados dos usuários”, alerta advogado
Para o advogado Aldo Evangelista, o projeto representa um grande risco à privacidade. Segundo ele, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) classifica a biometria da íris como um dado pessoal sensível que exige um nível elevado de proteção e justificativa para uso.
“O risco é grande. À luz da LGPD, a biometria da íris é um dado extremamente sensível. A recomendação é que as pessoas evitem esse tipo de entrega, principalmente porque não sabemos como esses dados estão sendo armazenados ou se estão realmente protegidos. Diversos países já questionaram a Tools for Humanity sobre esses aspectos, e o Brasil não é exceção”, afirmou o advogado.
Além disso, Evangelista destacou que muitos usuários têm focado na recompensa financeira, ignorando as possíveis consequências de um vazamento de dados.

“As pessoas estão sendo atraídas pela monetização, mas, caso esses dados sejam exfiltrados – ou seja, roubados –, o impacto pode ser devastador e irreparável. Quem se sentir lesado pode recorrer à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) ou ao Judiciário”, alertou.
Risco de clonagem e confusões digitais
A pesquisadora em Inteligência Artificial Laize Minelli apontou que o compartilhamento da biometria da íris também pode abrir espaço para clonagens digitais e outros tipos de fraude.
“A clonagem é um risco real, ainda que complexo. Quando entregamos um dado tão único quanto a íris, fornecemos informações que podem ser usadas para replicar características nossas e, eventualmente, causar confusões na criação de identidades digitais. Apesar de ser difícil, não é impossível com as tecnologias disponíveis atualmente”, explicou a especialista.

Minelli também destacou o lado positivo do projeto, como a tentativa de separar humanos de máquinas e a criação de um sistema único de criptomoedas. No entanto, ela reforçou a necessidade de cautela.
“Entregar dados tão sensíveis em troca de uma recompensa financeira imediata parece uma negociação arriscada. Estamos falando de algo extremamente valioso, que não pode ser facilmente recuperado caso seja comprometido. É preciso reflexão antes de aderir a propostas como essa”, afirmou.
Monitoramento do projeto
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) já está acompanhando o caso e pode tomar medidas caso identifique irregularidades no tratamento das informações. Especialistas recomendam que qualquer pessoa que se sinta lesada ou tenha dúvidas sobre a segurança do projeto busque orientação jurídica e entre em contato com a ANPD.