Letícia Rolim – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Após as acusações de estupro contra o cantor de forró Keven Fernandes, de 19 anos, do grupo Na Revoada, feitas pela mãe de uma adolescente de 12 anos, se intensificou nas redes sociais o debate sobre a erotização de menores.
O crime teria ocorrido na madrugada desta terça-feira, 20/2, após o cantor ter combinado encontro com a menina pelo o Instagram e buscar a adolescente na casa onde mora, na comunidade Parque das Nações, na zona Norte de Manaus.
Além de dar início a uma investigação policial, o caso trouxe à discussão o tema da erotização precoce e seus impactos sociais.
Músicas de gêneros como forró e funk, que frequentemente exaltam relacionamentos com “novinhas”, termo utilizado para se referir a menores de idade, têm sido apontadas como potenciais estimulantes desse fenômeno.
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Para a terapeuta e psicanalista Samiza Soares, a erotização precoce representa um fenômeno preocupante, com possíveis repercussões negativas no desenvolvimento psicológico e emocional de crianças e adolescentes.
“A exposição precoce à conteúdos sexualizados pode confundir a percepção que esses jovens têm sobre sua própria sexualidade e sobre relacionamentos saudáveis. Isso pode resultar em problemas de autoestima, dificuldades de estabelecer limites saudáveis e até mesmo em questões de identidade. Além disso, a erotização precoce pode contribuir para a vulnerabilidade desses jovens a abusos sexuais e para a adoção de comportamentos sexuais inadequados para a sua idade, impactando negativamente o seu desenvolvimento emocional e psicológico.
Samiza Soares, Terapeuta e psicanalista
Exposição à conteúdos sexuais
Samiza Soares destaca quatro pontos-chave sobre como a exposição à conteúdos musicais e culturais que romantizam relacionamentos com menores de idade pode moldar a percepção e o comportamento dos jovens.
Primeiramente, a psicanalista ressalta a possibilidade de uma percepção distorcida da sexualidade, que pode levar os jovens a aceitarem esse comportamento como algo comum.
“Ao ouvirem músicas que romantizam relacionamentos com pessoas mais jovens, os adolescentes podem desenvolver uma percepção distorcida da sexualidade, acreditando que é normal ou até mesmo desejável se envolver romanticamente com menores de idade.”, explica Samira.
A especialista detalha as possíveis distorções de valores que podem ser interpretadas pelos jovens:
Naturalização da erotização precoce – pode levar os jovens a verem a erotização precoce como algo comum e aceitável’, perpetuando padrões nocivos de relacionamentos na sociedade.
Impacto na autoimagem e na busca por relacionamentos – as músicas que exaltam relacionamentos com menores de idade podem influenciar a autoimagem dos jovens’, o que faz com que acreditem que devem se comportar de maneira mais adulta e sexualizada para serem aceitos ou desejados, de forma que não condizem com sua idade.
Perpetuação de padrões nocivos – a normalização da erotização de menores por meio das músicas e culturas populares ‘podem perpetuar padrões nocivos de relacionamentos, contribuindo para a vulnerabilidade das crianças e adolescentes a abusos sexuais e relacionamentos prejudiciais’.
Educação sexual
Samiza destaca a importância de trabalhar com os jovens para desenvolver uma compreensão crítica dos conteúdos a que estão expostos.
“É essencial promover uma educação sexual saudável, baseada no respeito mútuo e na valorização da integridade e da dignidade de todas as pessoas, independentemente da idade“, sugere a psicanalista.
Reflexos da internet na formação e erotização de menores
Segundo Samiza, a sociedade, incluindo a internet, contribui e influencia para a normalização da erotização infantil de diversas formas. Portanto, a psicanalista também cita pontos-chaves da formação e hipersexualização de menores de idade.
A primeira problemática citada por Samiza é a facilidade de acesso à conteúdos na internet que pode expor crianças e adolescentes a materiais sexualmente explícitos. “Esses conteúdos contribuem para a erotização precoce”, pontua.
Samiza afirma que a sociedade contemporânea, muitas vezes, valoriza a sexualidade como um produto a ser consumido, o que leva à objetificação sexual de menores de idade.
“Muitas vezes a mídia e a cultura popular ‘romantizam’ relacionamentos entre pessoas com grandes diferenças de idade, contribuindo para a normalização da erotização de menores”, alerta a especialista.
Para ela, a ausência de uma educação sexual abrangente e adequada pode deixar os jovens vulneráveis a mensagens distorcidas sobre sexualidade.
Como combater a ‘adultificação’?
De acordo com Samiza Soares, são necessárias medidas amplas e coordenadas para combater a normalização da ‘adultificação’ de menores. Da mesma forma, a terapeuta menciona possíveis medidas de combate a sexualização de menores de idade.
- Educação sexual – É fundamental promover uma educação sexual adequada e baseada no respeito mútuo, desde cedo, para que os jovens possam desenvolver uma compreensão saudável da sexualidade.
- Regulamentação de conteúdo – É importante que haja regulamentação e restrição de conteúdos que possam ser prejudiciais para crianças e adolescentes, especialmente na internet e na mídia.
- Conscientização e diálogo – Promover a conscientização sobre os impactos negativos da erotização precoce e incentivar o diálogo aberto sobre sexualidade podem ajudar a combater a normalização desse comportamento.
- Engajamento comunitário – É importante envolver a comunidade, incluindo pais, educadores, profissionais de saúde e líderes religiosos, na promoção de uma cultura que valorize a proteção e o bem-estar das crianças e adolescentes.
- Apoio às vítimas – É essencial oferecer apoio e assistência às vítimas de abuso sexual, bem como promover a denúncia de casos de exploração e abuso de menores.
“Independente das razões pelas quais uma criança busca interações com adultos, ela ainda é uma vítima quando essas interações envolvem comportamentos inadequados ou abusivos, pois não possui a capacidade de compreender completamente as consequências de seus atos”, destaca a terapeuta.
A psicanalista alerta, ainda, para alguns sinais, principalmente em relação a comportamentos incomuns, como isolamento, mudanças repentinas de humor ou interesse por conteúdos sexualizados.
Desse modo, o papel da sociedade e dos adultos responsáveis é proteger e orientar as crianças, garantindo que tenham acesso à informação adequada e que se sintam seguras para buscar ajuda em situações de risco.