Letícia Rolim – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Nesta segunda-feira, 7 de agosto, a Lei Maria da Penha celebra 17 anos desde sua instituição, sendo um marco significativo no combate à violência contra a mulher no Brasil. A Lei 11.340/06 tem sido considerada um novo paradigma na abordagem e enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres.
A lei federal, que leva o nome da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, busca coibir atos de violência contra a mulher em todos os seus aspectos, sejam eles físicos, patrimoniais, psicológicos, sexuais ou morais. Sancionada em 2006, essa legislação representa um avanço crucial na proteção dos direitos das mulheres e na luta contra a violência que permeia os lares.
Maria da Penha Maia Fernandes, a inspiração por trás do nome da lei, enfrentou uma tragédia pessoal que a levou a lutar por mudanças. Após sofrer duas tentativas de feminicídio por parte de seu marido, que a deixou paraplégica, ela se tornou um símbolo de resistência. O agressor só foi preso 20 anos após o incidente, mas o caso catalisou a apresentação de um projeto de lei em 2004, que se tornou a Lei Maria da Penha em 2006.
A delegada Débora Mafra, titular da delegacia especializada em crimes contra a mulher na zona centro-sul de Manaus, destaca a transformação que essa lei trouxe: “Há 17 anos, as mulheres no Brasil passaram a ter um olhar renovado e uma chance de escapar do ciclo de feminicídio. Inúmeras mulheres continuam vivas graças a essa lei, que tem o poder de afastar o agressor da vítima e interromper um ciclo de violência”.
Âmbitos de proteção
A Lei Maria da Penha não apenas protege a mulher agredida, mas também estende sua influência a toda a rede familiar. Com três âmbitos de proteção, a legislação abrange agressores tanto do sexo masculino quanto feminino, contribuindo para um ambiente mais seguro e igualitário para todas as mulheres do país.
O primeiro âmbito dessa legislação é o familiar, onde a mulher pode ter vínculos sanguíneos ou afetivos com o agressor, incluindo pais, mães, cunhados, sogros e outros. Além disso, mesmo pessoas não ligadas por laços de sangue, como aquelas que cresceram na mesma família, estão protegidas por essa lei. “Dessa forma, a lei assegura punições para qualquer agressor, independentemente do tipo de relacionamento existente”, explica Mafra.
O âmbito doméstico é outra esfera de proteção fornecida pela Lei Maria da Penha. Essa categoria inclui aquelas mulheres que residem e convivem com outras pessoas sob o mesmo teto, como babás, colegas de república, e empregadas domésticas. A lei visa criar um ambiente seguro para todas as mulheres, onde as relações não-românticas também estão protegidas.
“O âmbito domestico, é aquele onde ela reside. Se ela residir com pessoas que não abrange somente o relacionamento romântico, como a babá, a estudante que vive em república, a empregada doméstica que convivem em baixo do mesmo teto também são aparadas pela lei”, explicou Débora.
O terceiro e não menos importante âmbito é o relacionamento amoroso. Este é um dos maiores geradores de boletins de ocorrência, a Lei Maria da Penha está firmemente em vigor para proteger mulheres nesse contexto, oferecendo-lhes amparo legal para buscar justiça e segurança.
Vítima
Maria do Santos (nome fictício), de 34 anos, é uma das mulheres que foi uma vítima de violência física, patrimonial e psicológica por parte do seu então companheiro. Maria se viu obrigada a realizar o boletim de ocorrência na Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher após ser espancada.
A vítima ressaltou que o companheiro a agrediu e pegou todo o dinheiro que ela usava para pagar o aluguel da casa onde morava com a filha de dois anos.
“O pai da minha filha me bateu e me jogou no chão, eu corri e pedi socorro em um posto de gasolina, onde acabei dormindo lá e quando amanheceu o dia, as pessoas que me ajudaram perguntaram se eu queria denunciar na delegacia da mulher, porque não era a primeira vez que ele me espancava. Ele pedia desculpa, dizia que ia mudar, mas tudo não passava de mentiras. Desta vez, o dinheiro do aluguel que eu tinha, ele pegou e gastou tudo”, disse.
Apesar dos avanços, ainda persistem casos em que as vítimas não compreendem completamente a gravidade da situação ou resistem à prisão do agressor. Hoje, a lei é clara em evitar a revitimização das mulheres, eliminando a necessidade de audiências entre vítima e agressor. Isso permite que as mulheres que buscam ajuda nas delegacias possam seguir com os procedimentos sem desistir, representando uma mudança significativa em relação ao passado.
“Hoje a lei determina que não exista nem audiência entre vítima e agressor, para que ela não seja vitimizada. Quando a mulher vem a delegacia, ela faz o procedimento, e não pode desistir igual elas faziam antigamente”
Débora Mafra, delegada
A inclusão da lei é um ponto a ser destacado: ela ampara mulheres de todas as origens, sejam elas nascidas mulheres ou mulheres transgênero. A sua abordagem inclusiva é um reflexo do compromisso em proteger e promover os direitos de todas as mulheres, independentemente de sua identidade de gênero.
No Amazonas
O Amazonas enfrenta um desafio significativo no que diz respeito à violência contra a mulher, ocupando o 4º lugar no ranking de Estados com maior número de casos registrados, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023.
Dados do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJ-AM) ressaltam a urgência do problema, mostrando que mais de 1.400 Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) foram concedidas nos primeiros dois meses deste ano para mulheres vítimas de ameaças e violência doméstica.
A situação se agrava com os números alarmantes de casos registrados. Apenas em 2023, foram relatados 4.731 casos de violência pela Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc).
Diante desse cenário, o Amazonas está empenhado em conscientizar sobre as diversas formas de violência contra a mulher e em adotar medidas para combater essa realidade. O lançamento da campanha “Agosto Lilás” vai durar o mês todo com o objetivo de aumentar a conscientização e promover ações para assegurar os direitos das mulheres na região.
Como parte dessa iniciativa, as atividades serão intensificadas, com equipes da Sejusc presentes em pontos turísticos da cidade, bares, hotéis, motéis e centros comerciais. A presença estratégica visa educar, sensibilizar e informar tanto a população em geral quanto os locais frequentados pelas mulheres sobre a importância de prevenir e combater a violência doméstica.
Maria da Penha
A criação da lei representa uma homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes, uma mulher que enfrentou duas tentativas de feminicídio por parte de seu então marido.
Sua história de sobrevivência e determinação a tornou um símbolo icônico de resistência e defesa dos direitos das mulheres no Brasil.
Maria da Penha, farmacêutica brasileira e ativista dos direitos das mulheres, não apenas lutou para que seu agressor fosse condenado, o que aconteceu 20 anos depois, mas também se tornou uma líder em movimentos que buscam combater a violência doméstica.
Mãe de três filhas, ela se dedica incansavelmente à causa e fundou o Instituto Maria da Penha, uma ONG sem fins lucrativos que desempenha um papel fundamental na conscientização e na promoção da defesa das mulheres contra a violência doméstica.